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O conceito de primitivismo como chave de compreensão da arte moderna e contemporânea




O conceito de primitivismo como chave de compreensão da ...

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No contexto das vanguardas históricas, sobretudo para os cubistas e para os surrealistas, aquilo que era considerado primitivo parecia potencialmente capaz de promover rupturas com a tradição. Artistas modernistas representantes dos mais diversos estilos, colecionaram objetos e artefatos originários do Oriente, da África ou da Oceania - na maior parte das vezes ignorando seu contexto funcional ou ritualístico original - como se estes pudessem constituir um reservatório de novas formas, composições, cores e soluções inusitados. Em 1908 Wilhelm Wörringer elaborou uma tese bastante interessante, posteriormente publicada como livro, Abstração e empatia, na qual encontram-se imbricados artes decorativas, arte primitiva, abstracionismo e modernismo. Segundo Worringer, o artista moderno encontra na abstração um modo de ordenar o caos que o envolve movido pelo mesmo impulso que levou o homem primitivo a fazê-lo, pela necessidade de encontrar paz e estabilidade em um universo que lhe é hostil. Mas a manutenção da crença no primitivismo pode envolver um grau razoável de idealização e abstração acerca da arte produzida pelas culturas colonizadas, bem como a desconsideração das condições de sua produção. Assim, ao abolir barreiras disciplinares, a história da arte corre o risco de recorrer em alguns vícios que podem afetar a etnografia e a antropologia, quando estas colocam o etnógrafo em uma posição transcendente, explicando seu campo de investigação de acordo com suas próprias categorias de significação e reproduzindo a posição do colonizador vis-à-vis dos colonizados, ou do desenvolvido em relação ao primitivo. Posteriormente, em meados do século XX, reencontramos a atração pelo primitivo nos artistas do grupo Cobra e em vários representantes da Escola de Nova York, não tanto como uma apropriação das formas, mas da ideia do processo artístico como uma espécie de ritual, o que foi afirmado expressamente por Jackson Pollock, ao discutir o dripping, por exemplo. Os artistas da Escola de Nova York foram influenciados pelos surrealistas, com o quais conviveram e, como estes, bastante interessados em psicanálise, campo do conhecimento que, em certa medida coincide com o interesse modernista pelo primitivo, arcaico e mítico. O modernismo e a psicanálise compartilham uma visão segundo a qual o primitivo e o inconsciente se identificam. Na contemporaneidade, abordagens antropológicas, ou etnográficas, têm despertado muito interesse e a história da arte tem se voltado para uma reflexão acerca da cultura em um sentido amplo. Nos últimos vinte ou trinta anos metodologias e processos criativos inspirados na etnografia e na antropologia têm sido amplamente utilizados por artistas, curadores e críticos, em todo mundo, sendo emblemáticas, nesse sentido, as polêmicas exposições "Primitivism in 20th Century Art: Affinities of the Modern and the Tribal", com curadoria de William Rubin e Kirk Vanerdoe, montada no Museu de Arte Moderna de Nova York, em 1984 e "Les Magiciens de la Terre", com curadoria de JeanHubert Martin, realizada no Centre Georges Pompidou, em 1989. Desde a década de oitenta o debate teórico em torno do pós colonialismo se ampliou e se diversificou, mantendo-se bastante vivo ainda na atualidade. Essa abordagem antropológica e etnográfica também vêm sendo empregada de maneira significativa na construção de discursos sobre a arte e a identidade brasileiras, fato que pode ser observado a partir de projetos curatoriais de grandes mostras, como a Bienal da Antropofagia, a Mostra do Redescobrimento e, mais recentemente, as exposições Histórias Mestiças e Histórias Afro-Atlânticas, que parecem buscar apresentar uma fonte, uma origem, uma gênese da formação do povo brasileiro. A problematização dessa origem cultural e o interesse pelo primitivo na identidade nacional não são absolutamente novidades, antes disso, foram centrais para a construção do nosso modernismo, evocados por Oswald de Andrade no Manifesto Antropofágico e elaborados plasticamente por diversos representantes da primeira geração modernista, associada à Semana de Arte Moderna de 1922.


Os projetos curatorias das mostras em questão reforçam essa construção de uma origem, de uma identidade nacional primitiva. São como grandes montagens, capazes de produzir um saber histórico análogo àquele buscado por Walter Benjamin em suas Passagens, ou por Aby Warburg no Atlas Mnemosyne. Um tipo de saber histórico aprèscoup, como diria Didi-Huberman, fundado no anacronismo e na sobreposição de sintomas, sobrevivências de vestígios e de rastros materiais. Esse tipo de montagem das imagens encerra, segundo Didi-Huberman, um paradoxo na medida em que correndo constantemente o risco de recair no pseudomorfismo pode, também, revelar dimensões culturais e temporais inusitadas. Hoje, a discussão acerca do potencial crítico de tais mostras está em aberto, visto que elas tanto são capazes de revelar relações e percepções frutíferas sobre a formação da nossa cultura, como gerar a impressão de que reiteram um discurso já estabelecido sobre ela ou, ainda, fetichizar ou estetizar aquilo que consideramos primitivo.


Referências bibliográficas 1. BELTING, Hans, "Por uma antropologia da imagem", in Concinnitas 8, ano 6, vol. 1, junho 2006, pp. 65-78. 2. BOIS, Yves-Alain, "La Pensée Sauvage", in Art in America, Abril, 1985, p. 178-189. 3. DIDI-HUBERMAN, Georges, Diante do tempo - História da arte e anacronismo das imagens. Belo Horizonte: UFMG, 2015. 4. EINSTEIN, Carl, "Neger Plastik", in Concinnitas ano 9, volume 1, No 12, julho 2008. 5. FOSTER, Hal. "O artista como etnógrafo", in O retorno do real, São Paulo: Cosac Naify.

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